Dorian Gray: o horror do retrato essencialmente humano

O Retrato de Dorian Gray é um dos maiores clássicos da literatura. No entanto, por que o livro de Oscar Wilde é tão polêmico e assustador?

Dorian Gray: o horror do retrato essencialmente humano

Em paralelo com as inúmeras descobertas e invenções que marcaram o século 19, a arte ganhou também algumas de suas vertentes mais famosas, entre elas o Impressionismo e o Fauvismo. E assim, influenciado por movimentos vanguardistas, o romacista Oscar Wilde publicou uma das histórias mais polêmicas que o mundo já viu: O Retrato de Dorian Gray.

Censurada desde sua primeira publicação, a narrativa conta a história de Dorian Gray, um homem reconhecido por sua gritante beleza que decide vender sua alma e fazer um acordo para que, ao invés dele, seu retrato envelheça. É praticamente uma versão moderna do mito de Narciso. No entanto, o retrato de Dorian Gray vai se tornando mosntruoso ao passo que sua alma é corrompida.

Considerado indecente, promíscuo e profano, o romance foi altamente julgado pela comunidade britânica. Contudo, a história ganhou enorme repercussão e tornou-se até mesmo um exemplo de literatura gótica e um manifesto contra a repressão característica da Era Vitoriana. Contudo, acima disso, mesmo após mais de um século desde seu lançamento, O Retrato de Dorian Gray segue sendo um registro atemporal da essência humana.

Um breve resumo da história

Fonte: Leitor97

Dorian Gray, um jovem cuja beleza é fascinante, é convidado pelo pintor Basil Hallward para ser modelo de uma de suas obras. Ao passo que vai pintando o garoto, o artista fica cada vez mais fascinado por ele e comenta sobre isso com Lord Henry Wotton, um de seus amigos. Como resultado da propaganda de Basil, Henry decide conhecer Dorian.

Enquanto Basil reúne-se com Dorian para uma de suas sessões na qual o pintor aperfeiçoa seu retrato fiel do jovem, Wotton apresenta-se a Gray e apresenta seu estilo de vida hedonista, corrompendo assim a ingenuidade do garoto. A partir disso, Dorian Gray torna-se obcecado por sua aparência e faz de tudo para mantê-la intacta, chegando a transferir sua alma para o retrato pintado por Basil.

Com o passar do tempo, muito além do envelhecimento de Dorian, o retrato vai absorvendo também seus pecados e a trama se desenrola em torno das consequências dessa escolha de Dorian, resultando em um final um tanto quanto impactante.

Mas por que Dorian Gray é um personagem tão polêmico?

Dorian Gray: o horror do retrato essencialmente humano
Fonte: Plano Crítico

Segundo o filósofo Michel Foucault, a Era Vitoriana – período no qual a Rainha Vitória governou a Inglaterra – caracteriza-se pela repressão sexual e pregação da moral e dos bons constumes. Pois bem, assim como qualquer pessoa com o mínimo de experiência parental deve saber, proibir nunca é uma solução eficaz.

Dessa forma, mesmo que a sociedade vitoriana reprendesse manifestações que fugissem de suas regras, entre quatro paredes o hedonismo e aquilo que consideravam “libertinagem” ganhavam força. Portanto, o Retrato de Dorian Gray nada mais é do que um reflexo desse tradicionalismo forçado. Além disso, mesmo diante das críticas, segue sendo um bom exemplo de como reprimir a essência humana pode resultar em fins monstruosos.

Em suma, Dorian Gray é um personagem polêmico porque transcende os padrões impostos pela sociedade da época. Na verdade, padrões que ainda tem bastante força na atualidade. A figura transgressora de Wilde possui uma essência que vai além das limitações impostas ao gênero, chegando a ser considerada masculino-feminina. Ademais, o fato mais escandaloso em torno de Dorian Gray está no fato dele se sentir livre para explorar a própria sexualidade e abraçar suas experiências humanas.

E por que a história é considerada um clássico do horror?

Fonte: Paul Vampion

Pois então, para além de representar o terror da família tradiconal ingresa, O Retrato de Dorian Gray não deixa de ser assustador para a sociedade em geral. Assim como mencionado acima, a história de Wilde parece uma releitura do mito de Narciso, onde a beleza extrema do protagonista apenas camufla seu comportamento monstruoso.

Apesar de inicialmente ingênuo, Dorian Gray é corrompido por Lord Henry e, dessa forma, cai na armadilha da perda de sua humanidade. Muito além das assombrações noturnas e atmosfera de suspense e tensão características da literatura gótica, o real horror de O Retrato de Dorian Gray está em sua inclinação à corrupção.

O próprio protagonista não é capaz de viver com a culpa que carrega em vida e, partindo disso, busca uma escapatória dessa situação. No entanto, existe algo mais aterrorizante do que não ser capaz de fugir de si mesmo? Desconhecendo sua própria natureza e desligado de sua alma, Dorian Gray deixa de sentir-se humano. E, nesse paradoxo existencial, mora o grande trunfo da escrita de Wilde, a identificação do leitor com o personagem, o medo de ter algo em comum com Dorian.

Curiosidades sobre O Retrato de Dorian Gray

Dorian Gray: o horror do retrato essencialmente humano
Fonte: Revista Galileu

Censura

Fonte: Buscapé

O Retrato de Dorian Gray foi considerado tão polêmico em seu lançamento que a editora recolheu todos os exemplares restantes das bancas. Todavia, muito antes disso, censuraram centenas de palavras da história.

Oscar Wilde, o autor do romance, mais tarde escreveu um prefácio no livro onde publicou a história de Dorian Gray e disse que o problema não está na história em si e sim na interpretação que as pessoas tem dela. Afinal, a promiscuidade está nos olhos de quem vê.

 Os personagens refletiam Oscar Wilde

Dorian Gray: o horror do retrato essencialmente humano
Fonte: Revista Híbrida

Além disso, como estratégia narrativa, Wilde costumava utilizar seus personagens como porta-vozes de suas críticas. Só para ilustrar, no caso de O Retrato de Dorian Gray, Lord Henry o representa ao criticar costumes e atitudes da época aristrocrática. Aliás, Wilde explorava a polissemia de suas palavras e até hoje estudiosos debatem o real significado de suas histórias.

Em uma de suas cartas publicadas, Oscar Wilde revelou que os três personagens principais de O Retrato de Dorian Gray são extensões de si mesmo. Por exemplo, “Basil Hallward representa aquilo que penso e sou; Lord Henry representa o que o mundo pensa de mim; e Dorian é aquilo que eu gostaria de ser”.

O Retrato de Dorian Gray foge da Belle Époque

Fonte: Reversível

Apesar de se apoiar em movimentos vanguardistas, a obra de Wilde pertence às correntes esteticista e hedonista. Estas últimas, por sua vez, possuem o belo e o prazer como principal finalidade.

O fim de Oscar Wilde

Fonte: Casa Vogue

No século 19, a Inglaterra e muitos outros países consideravam a homossexualidade um crime. Então, após ser exposto, conderam Oscar Wilde à prisão. Ademais, sua obra deixou de ser impressa no país por 20 anos. Após sair do cárcere, o escritor ainda passou os três anos restantes de sua vida em exílio.

A Síndrome de Dorian Gray

Dorian Gray: o horror do retrato essencialmente humano
Fonte: A Soma de Todos os Afetos

Por fim, existe um distúrbio mental chamado Síndrome de Dorian Gray. Nele, a preocupação excessiva com a aparência física e medo do envelhecimento levam a um diagnóstico médico.

E então, o que achou dessa matéria? Se gostou, confira também: American Horror Story: histórias reais que inspiraram a série.

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