Vez ou outra, um nome desconhecido do grande público emerge em meio a alguma polêmica. Geralmente, em tempos de crise, isso se torna mais comum. Nos últimos dias, o nome de Edward Colston foi notícia em quase todos os cantos do mundo, tornando-o símbolo do combate ao racismo.
Ter uma estátua em bronze, com cerca de cinco metros e meio, não é para qualquer personalidade. Entretanto, ter uma estátua com essa magnitude derrubada, arrastada e jogada em um rio, também não é para qualquer pessoa.
Esses dois lados definem o que foi a vida de Colston e como ele é visto nos dias de hoje: um mercador de escravos, filantropo, que fez fortuna no século XVII, integrando também o parlamento britânico. Portanto, o destaque nos noticiários despertou a curiosidade de muitos, afinal, quem foi Edward Colston?
História de Edward Colston
Edward Colston nasceu em 2 de novembro de 1636, no bairro de Temple Street, em Bristol. Essa pequena cidade, fica localizada ao sudoeste da Inglaterra. Filho primogênito de comerciantes ricos, Colston logo se envolveu com a vocação dos pais: o comércio.
Ainda jovem, foi aprendiz na Mercers ‘Company, empresa centenária que ainda hoje está em atividade. Em seguida, Colston obteve sucesso no principal ponto de renda para os comerciantes da época, o porto de Bristol. Curiosamente, o mesmo lugar onde, nos dias atuais, sua estátua foi arremessada.
O porto de Bristol era um dos principais pontos de comércio mercantil da época. Por isso, começou a negociar ainda jovem produtos como tecidos, óleo, vinho e frutas com Espanha, Portugal, Itália e África. Foi por meio destes negócios que Colston tornou-se um homem rico e conhecido em sua cidade natal.
Ingresso no mercado de escravos
No século XVII, o mercado escravocrata estava a todo vapor, o que atraiu o bom comerciante. Na Inglaterra, especificamente em Londres, existia a Royal African Company, uma empresa especializada no comércio de escravos vindos da África. Assim como ponto de comércio para alimentos e tecidos, Bristol também tornou-se ponto estratégico para venda de escravos.
Daquele lugar, muitos eram mandados para a América, onde a Inglaterra ainda mantinha colônias. Colston entrou para a Royal African Company, em 1680, quando tinha 44 anos de idade, já como um homem rico.
Edward Colston se envolveu diretamente na administração da empresa, onde permaneceu por cerca de 11 anos, chegando a ser vice-presidente. A empresa realiza um trabalho comum na época, transportava milhares de escravos pelo Oceano Atlântico. Estima-se que Colston transportou 84 mil escravos, contudo, 19 mil morreram no meio do oceano, indo para ás Américas.
Foi a partir desse período que Colston construiu a maior parte de sua fortuna. Em 1683, foi adicionado na Sociedade de Empreendedores Comerciais, tornando-se burguês. De acordo com dados históricos, Colston chegou a ter mais de 40 navios em sua frota.
Edward Colston e a caridade
Como um homem rico que foi, Colston ficou bastante conhecido em toda Inglaterra por seus atos de caridade. Entre 1690 e 1700, financiou grandes projetos em Bristol e Londres, como escolas, hospitais, instituições de caridade e igrejas. Além disso, Colston mantinha um fluxo mensal de presentes, também em dinheiro para reparos e novas aquisições.
Contudo, junto com expressivas doações, Colston exigia em cláusulas, que deveriam manter uma rotina cristã nas escolas e orfanatos. David Hughson, um escritor inglês, descreveu Colston em 1808 como “o grande benfeitor da cidade de Bristol, que, durante sua vida, gastou mais de 70 mil libras esterlinas em instituições de caridade”.
Construção da estátua
Edward Colson morreu em 11 de outubro de 1721, aos 84 anos, em sua casa no distrito de Mortlake, em Londres. Apesar de pedir em seu testamento um velório simples, o funeral de Colston foi um grande evento em sua cidade natal. O monumento do túmulo foi projetado pelo arquiteto James Gibbs.
Apesar de todos esses feitos em vida, as homenagens à Colston só começaram a surgir quase dois séculos após sua morte. A tão mencionada estátua, que foi manchete em vários locais, só foi erguida em 1895, e isso tem uma explicação histórica.
Segundo historiadores, o período final da Era Vitoriana viu uma massa de estátuas subindo pela Europa. De acordo com o historiador Eric Hobsbawm, essa massa de estátuas foi chamada de “invenção da tradição”. Portanto, as sociedades procuravam pessoas que encarnavam certas virtudes, em Bristol, a estátua de Colston fazia parte de uma tentativa de remontar o espaço cívico em torno de “grandes homens”.
Colston era o homem mais famoso de Bristol, nascido e criado na cidade, portanto, era visto como digno de um reconhecimento mais proeminente. A construção da estátua e todo o fanatismo por Colston nesta época fizeram parte de uma tentativa contínua de obscurecer o papel de Bristol no comércio de escravos,
Por isso, Colston aparece apenas como um comerciante ligado ao mar. A estátua faz alusão a um golfinho que supostamente salvou um de seus navios obstruindo um vazamento. A placa na estátua diz que ela foi “erguida pelos cidadãos de Bristol como um memorial de um dos filhos mais virtuosos e sábios de sua cidade”.
Outras honrarias
Além da estátua, o nome de Colston está em vários locais da cidade como o Colston Tower, Colston Hall, Colston Avenue, Colston Street, Colston’s Girls ‘School, Colston’s School, Colston’s Primary School e Temple Colston School (agora parte de St Mary Redcliffe e Temple School).
Apesar de toda devoção ao longo do século XVIII e XIX, os feitos de Colston começaram a gerar polêmica na sociedade britânica. De acordo com jornais e revistas locais, as homenagens à Colston, incluindo a grande estátua construída no centro de Bristol, já vinham sendo motivo de discussão nos últimos anos.
Posteriormente, uma das casas de show mais famosas da cidade, Colston Hall, foi alvo de boicotes por parte de artistas. Como resultado, terá o nome trocado em breve.
Releitura histórica
Quando a estátua foi construída, Edward Colston representava respeito e grande riqueza para o povo local. Contudo, a queda e o simbolo que tornou-se jogar a estátua no porto de Bristol, após arrastá-la pela Avenida Colston, representa uma releitura histórica dos fatos que marcaram um período sombrio da história mundial.
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Fontes: The History Of Parlament, Dolphin Society, The Conversation, G1, Aljazeera.
Imagens: Global Citizen, Artuk, Bristol247, The Times.