A língua portuguesa brasileira é muito rica em variações de palavras e significados, algumas tendo uma história por trás de suas origens. A palavra baderna é um exemplo disso, pois atrás de sua origem, há uma história com personagens reais, que teve início no século XIX.
A palavra baderna começou a ser usada na época do Império do Brasil. Entre seus significados estão, bagunça, desordem, alvoroço e confusão. Todavia, baderna é uma palavra exclusiva do português do Brasil.
Porém, sua origem é bem inusitada, pois a palavra baderna era usada para denominar pessoas que eram fãs de uma bailarina italiana talentosa da época.
Seu nome era Marietta Baderna Giannini, que graças ao seu talento no balé, conquistou uma legião de fãs, que fazia muito alvoroço quando a viam. Além de fazerem muito barulho, festejavam e gritavam pelo nome de Baderna, e foi daí que surgiram os significados da palavra.
Por isso, os seguidores de Marietta Baderna, eram conhecidos como os badernas. No entanto, esse termo é usado hoje em dia como baderneiros, para nomear pessoas que causam bagunça ou desordem.
O que é baderna
De acordo com o dicionário brasileiro, baderna é uma palavra feminina, de origem exclusiva brasileira, cujo significado está relacionado a situações de desordem e confusão.
A palavra baderna possui função pejorativa. Ela começou a ser usada no Rio de Janeiro, no século XIX, graças à bailarina italiana Marietta Baderna, que ficou conhecida como Maria Baderna.
Devido ao grande alvoroço causado pelos seus fãs, sempre que se apresentava, o nome baderna começou a ser usado como referência aos fãs. Hoje, a palavra baderna é usada para definir a ausência de regras.
Maria Baderna ficou conhecida tanto pelo seu talento como bailarina, quantos pelos seus ideais políticos e sociais, que não eram bem vistos na época. Afinal, seus costumes eram mais liberais do que os praticados pelos brasileiros, em uma época em que a escravidão vigorava.
Por isso, quando Maria Baderna resolveu juntar o balé com o lundum, dança de origem africana que era praticada pelos escravos, causou espanto e indignação. Consequentemente, seus fãs não eram muito bem vistos pela alta sociedade, principalmente devido à todo o alvoroço durante as apresentações de Maria Baderna.
Origem de Marietta Baderna Giannini
A bailarina Maria Baderna era da cidade de Castel San Giovanni, província de Piacenza, no norte da Itália. Ela nasceu em 1828, era filha de Antônio Baderna, que além de médico era músico nas horas vagas.
Baderna se interessou pelo balé clássico, graças sua total dedicação, estreou aos 12 anos nos palcos dos teatros. Logo entrou para a companhia de dança do teatro Scala, de Milão. Assim, aos 21 já se destacava como prima ballerina assoluta (primeira bailarina absoluta).
Seu talento não passou despercebido, devido a isso, fez sucesso por toda a Itália, além de participar de turnês pelos países europeus.
Mas, Maria Baderna, não era conhecida apenas pelo seu talento artístico, mas também, pelas ideias e costumes revolucionários para a época. Apesar de se apresentar em salões tradicionais, Baderna gostava das ruas, onde gostava de festejar, de sexo e bebidas.
E foi nas ruas que ela descobriu sua paixão pelas danças africanas, que traziam sensualidade e ritmo dançante. No entanto, sua paixão foi além da dança, Baderna começou a participar de reuniões populares de resistência dos escravos.
A partir daí, resolveu incorporar aos passos delicados do balé, alguns passos de danças africanas como, do lundu, da cachuca e da umbigada. Assim, caracterizando Baderna como a bailarina do povo.
Exílio no Brasil
Na Europa do século XIX, acontecia um movimento contra a ocupação austríaca na Itália, Maria e seu pai eram apoiadores do movimento democrático. No entanto, os rebeldes revolucionários resolveram usar a vida artística como protesto, ou seja, não haveria nenhuma manifestação artística no país, enquanto durasse a ocupação.
Maria e seu pai participaram do protesto. Porém, a perseguição política direta sofrida pelos apoiadores do movimento democrático era intensa, e assim Baderna e seu pai resolveram sair do país.
A família Baderna chegou ao Brasil em 1849, procurando por exílio.
A palavra baderna como conhecemos hoje
Baderna chegou ao Brasil quando era um país conservador do império escravocrata, que era governado por Dom Pedro II. Graças ao seu incrível talento, foi contratada pelo Teatro São Pedro de Alcântara, na capital imperial, Rio de Janeiro.
Baderna estreou nos palcos brasileiros, em 29 de Setembro de 1849, com o balé Il Ballo delle Fate. Era tão boa na dança clássica, que não demorou em ganhar legiões de fãs.
Ao final das apresentações, seus fãs ficavam tão maravilhados que não conseguiam se conter, por isso, gritavam seu nome e faziam muito barulho, eram mal visto pela sociedade da época, que associou o barulho, a desordem e a paixão incontida dos fãs a algo ruim. Logo, os fãs ficaram conhecidos como os badernas.
E foi assim que a palavra baderna, com o significado de desordem, surgiu. Hoje, faz parte da língua portuguesa brasileira.
Importância histórica
A junção da dança africana com o balé agradou o gosto do povo, porém, não agradaram à crítica conservadora, os empresários e a sociedade imperial. Como resultado, começaram a atacar a bailarina, a colocando em papeis menos importante, ou no fundo do palco, e em alguns casos era excluída dos espetáculos.
No entanto, quanto mais Maria Baderna era boicotada, mais os badernas se expressavam ruidosamente.
Assim, o nome Baderna que inicialmente era tratado pelos jornais da época como sinônimo de elegância, passou a ser utilizado para significar bagunça, desordem e depravação.
Por fim, Baderna parou de ser contratada, e quantos mais tentavam expulsa-la do país, mais os trabalhadores, estudantes e escravos a viam como um símbolo de um Brasil mais livre.
Maria Baderna foi pioneira no ensino de dança no Brasil, onde tentou criar uma escola profissionalizante em 1851, além de ter lecionado em escolas só para garotas do Rio de Janeiro.
A bailarina ficou conhecida como símbolo da resistência e da liberdade, pois através da sua expressão artística, expôs como a elite e os poderosos eram contra a educação, e a liberdade de expressão popular. Por isso, através de sua dança, ela expressava a luta por uma sociedade mais igualitária.
De volta à Itália
Não se sabe ao certo como foi o fim de sua vida, dizem que retornou à Itália, onde deu aulas de dança até sua morte, em 1870.
Infelizmente Maria não viveu para ver a abolição da escravatura no Brasil, e nem a convergência entre a alta cultura e a cultura popular. Que mais tarde se tornaria a base para grandes revoluções artísticas e éticas na cultura do país.
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Fontes: Terra, Hypeness, Revista Galileu
Imagens: Terra, Vecteesy, Jornal Cruzeiro, Blog Wilson Vieira