O Talibã é tipicamente retratado como um grupo de homens com barbas, turbantes e armas impulsionados pela ideologia fundamentalista islâmica e responsáveis por atos de terrorismo e violência. Mas para entender o grupo que luta pelo poder e controle do Afeganistão, precisamos de uma imagem muito mais ampla.
Para começar, é importante entender as origens do Talibã na década de 1980 durante a guerra fria. Os guerrilheiros afegãos chamados Mujahideen ou Mujahidin travaram uma guerra contra a ocupação soviética por cerca de uma década. Eles receberem financiamento e equipamentos de uma série de potências externas, incluindo os Estados Unidos.
Todavia, em 2001, o Talibã foi destituído do poder no Afeganistão pela invasão liderada pelos Estados Unidos. No entanto, depois que as tropas americanas e da coalizão se retiraram do país devastado pela guerra, 20 anos depois, os combatentes recuperaram o controle a uma velocidade alarmante.
Com efeito, os comandantes do grupo anunciaram a criação de um “Emirado Islâmico” e insistiram que querem o poder absoluto sobre o território afegão.
O que é Talibã?
O grupo teve origem no início da década de 1980 por mujahideen afegãos, ou guerrilheiros islâmicos, que resistiram à ocupação soviética do Afeganistão entre 1979-1989.
Esses combatentes afegãos receberam apoio da Agência Central de Inteligência dos Estados Unidos (CIA), da agência de inteligência militar do Paquistão e da Inter-Services Intelligence (ISI).
Eles se juntaram a tribos pashtun, o grupo étnico predominante em grande parte do sul e leste do país, que estudou nas madrassas do Paquistão (escolas religiosas islâmicas). Aliás, Talibã significa “estudantes” em pashto (dialeto do Afeganistão).
O grupo obteve o apoio do povo afegão na era pós-soviética, depois de prometer estabilidade após décadas de agitação que deixou milhares de mortos e milhões fugiram do país. Depois de tomarem Cabul em 1996, o Talibã declarou o Afeganistão um emirado islâmico e controlava 90% do país.
O regime caiu por uma invasão liderada pelos EUA em 2001 por fornecer refúgio à Al-Qaeda e Osama bin Laden, o mentor dos ataques terroristas em 11 de setembro.
Como é o governo Talibã?
O Talibã impôs políticas severas em sua direção a uma sociedade dominada pela sharia. Isso incluía restrições estritas às mulheres, excluindo-as de quase todos os aspectos da vida pública, incluindo a escola e o trabalho.
Mulheres e meninas também foram obrigadas a usar uma burca, um véu que cobre o rosto e o corpo, enquanto os homens eram obrigados a deixar a barba crescer.
O grupo implementou punições criminais brutais de acordo com sua interpretação estrita da lei sharia, como execuções públicas e amputações de membros para infratores.
Eles também baniram a música e a televisão e destruíram esculturas e textos históricos e culturais no Afeganistão, principalmente as estátuas de Buda do século 6 esculpidas na encosta de um penhasco no vale de Bamyan, no centro do Afeganistão, que foram destruídas em março de 2001.
O que é a lei sharia?
Sharia é o conjunto de leis e preceitos que governam a vida diária dos muçulmanos. Ela se baseia em uma combinação do Alcorão, o livro sagrado do Islã, e os ensinamentos do profeta Maomé.
Sharia significa literalmente ‘o caminho’. Entretanto, muitos estudiosos concordam que a lei sharia possui diversas interpretações para grupos de mulçumanos distintos.
Desse modo, a lei sharia, sob a interpretação extremista do Talibã, faz com que as mulheres, por exemplo, não recebem nenhum direito.
Como o grupo é financiado?
O Talibã se financia em grande parte por meio do comércio de ópio, com o Afeganistão fornecendo a grande maioria da heroína ilícita em todo o mundo.
Os insurgentes cobram um imposto em todas as fases do processo de produção da droga, desde os produtores de papoula até os comerciantes que transportam a heroína para os países vizinhos. O grupo também ganha dinheiro com a mineração ilegal e o comércio de minerais.
De acordo com um relatório confidencial encomendado pela Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), o grupo ganhou 1,6 bilhão de dólares no ano financeiro encerrado em março de 2020. Além disso, o Talibã também tributa as indústrias locais e impõe os impostos islâmicos.
Como o Talibã recuperou o controle do Afeganistão?
Estima-se que o Talibã tenha entre 58.000 e 100.000 combatentes. Eles se reagruparam no Estado vizinho, Paquistão, e lideraram uma insurgência contra o governo afegão apoiado pelos EUA por quase 20 anos.
Em fevereiro de 2020, o Talibã assinou um acordo de paz com o governo do ex-presidente Donald Trump, que dizia que as forças dos EUA e da Otan se retirariam do Afeganistão em 14 meses, desde que o grupo mantivesse sua parte no acordo.
Os objetivos do acordo incluíam impedir que grupos terroristas usassem o Afeganistão como base para ataques contra os EUA e seus aliados, negociações de paz entre o Talibã e o governo afegão e um cessar-fogo permanente.
No entanto, os negociadores do Talibã ignoraram os apelos por negociações de paz com o governo afegão antes de lançar uma oferta pelo poder. O grupo obteve grandes ganhos em todo o país, com as tropas americanas forçadas a fazer uma retirada precipitada.
Assim, depois de assumir o controle nas principais cidades de Kandahar e Ghazni em 10 de agosto, o Talibã entrou em Cabul em 15 de agosto de 2021, quando o presidente do Afeganistão fugiu.
Talibã, Estado Islâmico e Al-Qaeda
O chamado Estado Islâmico (EI), a Al-Qaeda e agora o Talibã são grupos jihadistas radicais que visam livrar o mundo da ameaça, como eles percebem, que a cultura ocidental representa para o Islã.
No entanto, embora no geral compartilhem uma ideologia semelhante, seus pontos de vista diferem significativamente – tanto que os três grupos frequentemente se encontram em conflito um com o outro.
Mas quais são as diferenças entre essas três organizações terroristas proeminentes? Veja a seguir!
Al Qaeda
A Al-Qaeda segue o wahhabismo e é uma forma extrema do islamismo sunita que insiste em uma interpretação literal do Alcorão. O grupo surgiu em 1988 no Paquistão por Osama Bin Laden e Muhammad Atif, pouco antes da retirada das forças soviéticas do vizinho Afeganistão.
Al-Qaeda significa ‘fundação’ em árabe e eles acreditam que devem usar a Jihad para mobilizar sua variação do Islã. Eles acreditam no conceito de ‘jihad defensiva’; ou seja, é obrigação de todo muçulmano lutar contra aqueles que podem ser vistos como opositores do Islã.
O grupo terrorista estava por trás dos ataques de 11 de setembro de 2001 em Nova York, que mataram 2.977 pessoas. O grupo via o Ocidente e sua cultura como uma ameaça ao Islã, e seu principal objetivo era estabelecer um estado islâmico baseado na lei Sharia.
No entanto, especialistas argumentam que a Al-Qaeda se fragmentou ao longo dos anos em uma variedade de movimentos regionais que têm pouca conexão entre si.
O Talibã
O Talibã difere da Al-Qaeda porque muitos de seus princípios derivam do modo de vida tribal tradicional pashtun no Afeganistão. Embora ambos pratiquem ramos do islamismo sunita.
O grupo ganhou destaque no Afeganistão no outono de 1994 e governou o país por cinco anos, de 1996 a 2001.
Talibã significa ‘estudante’ em árabe, e é amplamente especulado que o grupo emergiu primeiro de seminários religiosos que pregavam uma variação estrita do islamismo sunita.
Originalmente, eles prometeram restaurar a paz e a segurança por meio da lei Sharia em áreas pashtun do Paquistão e Afeganistão. No entanto, o grupo impõe leis extremamente rígidas pelas quais seus cidadãos devem viver.
Ademais, ao contrário da crença popular, não existe um único ‘Talibã’, mas vários grupos diferentes. O maior e mais eficaz grupo no Paquistão é o TTP. Aliás, foi este grupo que tentou assassinar Malala Yousafzai por ir à escola sob o governo do grupo.
Estado Islâmico
O Estado Islâmico foi firmemente estabelecido em 2014. Nas semanas seguintes a cidade de Mossul foi libertada quando comandantes do Talibã desertaram e juraram lealdade ao líder do (EI), Abu Bakr al-Baghdadi.
Os comandantes renegados eram, em sua maioria, aqueles que haviam ficado insatisfeitos com a liderança do mulá Mohammed Omar, que na época chefiava o Talibã. Embora a mídia tenha sido povoada por histórias do EI nos últimos dois anos, os grupos do Talibã têm um número muito maior de seguidores.
Além disso, os membros do Talibã ensinam uma forma do ramo Deobandi – que na verdade é menos extrema do que a versão da tradição wahhabi-salafista praticada pelo EI e pela al-Qaeda.
7 curiosidades sobre o Talibã
1.Talibã significa estudante, em pastho
O Talibã é o Movimento de Estudantes do Conhecimento Islâmico famoso por implementar o tipo mais extremo de Sharia (lei islâmica) no Afeganistão.
2. O grupo surgiu para combater as forças soviéticas
Quando o Afeganistão foi ocupado pelas forças soviéticas, o Talibã foi criado para lutar na guerra contra as forças soviéticas. Os lutadores extremamente treinados e mortais conseguiram retirar as forças soviéticas do país.
3. O Talibã governou com crueldade quando assumiu o poder em 1994
Assim que chegaram ao poder, os talibãs começaram a introduzir sua versão extrema da Sharia – as mulheres tinham que usar uma burca que cobrisse tudo, assassinos e ladrões e adúlteros eram executados sem julgamento e os homens tinham que deixar a barba crescer.
4. Tratamento dado pelo Talibã às mulheres
O tratamento dado pelo Talibã às mulheres chocou as pessoas em todo o mundo. Eles consideravam as mulheres inferiores e impunham-lhes várias restrições “para proteger a virtude e prevenir o vício”. Às vezes, elas até mesmo não recebiam tratamento hospitalar, para evitar que interagissem com funcionários e médicos do sexo masculino.
5. O Paquistão e a guerra com o Talibã
O Paquistão, que antes apoiava o Talibã logo reconheceu os militantes devotos pelo que realmente eram. Eles romperam os laços com a organização e lutaram contra os ataques do Talibã em solo paquistanês.
6. Cultivo de ópio
Uma das fontes de renda do Talibã era o cultivo e o contrabando de ópio. Assim, durante seu governo, a principal fonte de renda de muitos afegãos era o cultivo de ópio.
7. Líderes talibãs operam sob identidades falsas
Por fim, os chefes do Talibã, até agora, nunca usaram seus nomes verdadeiros durante as operações. Ou seja, eles sempre operam sob uma identidade falsa para evitar o reconhecimento.
Então, agora que você sabe o que é Talibã, leia também: Estado islâmico, o que é, como surgiu e sua ideologia
Fontes: Exame, Guia do Estudante, Brasil de Fato, G1
Fotos: Outlook India
Capa: CNBC