Nos últimos dias um tema vem despertando bastante debate na internet, o abuso ou tortura psicológica, isso, devido a acontecimentos envolvendo os participantes do BBB21. Infelizmente, as pessoas costumam ter dificuldades em identificar esse tipo de violência psicológica, principalmente as vítimas, que quase sempre sentem como se elas fossem a parte errada da história. Por isso, a discussão sobre violência psicológica é muito importante e necessária nos dias de hoje.
Afinal, assim como agressões físicas, a tortura psicológica pode causar danos, ferir, destruir a confiança e autoestima de uma pessoa ao ponto dela questionar sua sanidade ou inteligência.
Também conhecida como gaslighting, a tortura psicológica consiste em um agressor que distorce informações, omite a verdade, conta mentiras, manipula, faz ameaças, entre tantas outras violências psicológicas. No entanto, não existe um perfil da vítima de violência psicológica, qualquer pessoa pode se tornar vítima, independente do tipo ou condição da pessoa.
Portanto, pode acontecer dentro de relacionamentos, ambiente profissional ou afetar até mesmo crianças.
Por isso, é muito importante saber identificar os sinais do abuso o quanto antes, pois pode causar um impacto negativo muito grande na saúde mental da vítima. Ademais, para identificar os sinais, uma maneira seria observar atitudes ou situações que envolvam o agressor e a vítima. E é importante destacar que tortura psicológica é crime.
O que é tortura psicológica?
A tortura psicológica é um tipo de abuso que consiste em um conjunto de agressões sistemática ao fator psicológico da vítima. Cujo objetivo é causar sofrimento e intimidação, mas, sem recorrer a contato físico para conseguir o que quer, ou seja, manipular ou punir. Entretanto, na literatura brasileira esse tema ainda é escasso, por isso, o embasamento teórico é feito com autores estrangeiros.
De acordo com a ONU (Organizações das Nações Unidas- 1987), a tortura, seja física ou psicológica, consiste em todo ato com a intenção de causar sofrimento ou dor intencionalmente. No entanto, esse conceito usado pela ONU está relacionado à tortura exercida em sequestros ou em guerras. Porém, pode ser usado no âmbito dos relacionamentos interpessoais, já que o agressor psicológico sempre possui um objetivo oculto com relação à vítima do abuso. Mesmo que o agressor não tenha consciência de que suas ações se caracterizam como tortura psicológica. Ainda assim, ele escolhe seguir por esse caminho para causar sofrimento mental e emocional à pessoa que desgosta.
Ademais, tortura psicológica é considerada crime. De acordo com a Lei 9.455/97, o crime de tortura não se trata apenas de abusos físicos, mas toda situação que resulte em sofrimento mental ou psicológico. Mas, para que o ato seja configurado como crime é necessário à identificação de pelo menos uma das seguintes situações:
- Tortura com o fim de incitar alguém a prestar informações ou declarações pessoais ou de terceiros.
- Violência para provocar ação ou omissão de natureza criminosa.
- Abuso em razão de discriminação religiosa ou racial.
Entretanto, caso nenhuma dessas situações faça correspondência com a acusação de violência psicológica, os atos violentos ainda podem configurar outro tipo de crime. Por exemplo, constrangimento ilegal ou ameaça.
Como identificar a tortura psicológica?
Para identificar a tortura psicológica não é tão simples, pois geralmente as agressões são muito sutis, onde são disfarçadas por comentários maldosos ou indiretos. No entanto, os abusos são frequentes, de tal forma que a vítima se sente confusa com as atitudes do agressor e não sabe como responder ou reagir.
Da mesma forma, a relação entre vítima e agressor, também pode dificultar na identificação dos abusos. Pois, a tortura psicológica pode ser cometida por parceiros, chefes, amigos, colegas de trabalho, familiares ou qualquer outra pessoa que faça parte do círculo social da vítima. Portanto, o grau de afeição entre a vítima e o agressor pode afetar a forma como a vítima assimila a violência. Pois ela tem dificuldade em acreditar que tal pessoa seria capaz de fazer esse tipo de coisa com ela.
No entanto, nem todas as ações do agressor são sutis, pois é facilmente percebido as intenções nada inocentes do agressor e o semblante e postura de derrota da vítima. Ainda assim, o agressor tende a esconder suas atitudes atrás de justificativas infundadas. Por exemplo, afirma agir daquela maneira porque quer ser “sincero” ou porque a vítima merece aquele tratamento devido a suas ações.
Atitudes de quem pratica a tortura psicológica
1 – Nega a verdade
O agressor nunca admite a veracidade dos fatos, mesmo que ajam provas, ele irá negar e refutar todas elas. E é assim que a violência psicológica acontece, pois ele faz com que a vítima questione sua realidade, fazendo com que ela comece a duvidar de suas convicções. O que a torna submissa ao agressor.
2 – Usa o que a vítima mais gosta contra ela
O agressor usa o que é mais precioso para a vítima para depreciá-la, como usar os filhos da vítima, por exemplo, afirmando que ela não é boa o suficiente para eles ou que ela nunca deveria ter sido mãe.
3 – Suas ações não condizem com suas palavras
Quem comete tortura psicológica, geralmente tem ações completamente diferentes de suas palavras, ou seja, entra em contradições. Então, uma maneira de identificar o agressor é prestando a atenção se suas atitudes e ações condizem com suas palavras.
4 – Tenta confundir a vítima
A tortura psicológica passa por um ciclo, onde o agressor fala constantemente coisas ruins para a vítima, para logo em seguida elogia-la de alguma forma para mantê-la submissa a ele. Dessa forma, a pessoa se mantem vulnerável aos novos ataques que logo se seguem.
5 – Tenta colocar a vítima contra as outras pessoas
O agressor utiliza de todas as formas de manipulação e mentiras para afastar a vítima de todos do seu ciclo social, inclusive a própria família. Para isso, o agressor diz que as pessoas não gostam dela ou que não são boa companhia para ela. Então, com a vítima afastada de pessoas que podiam alertar sobre o que está errado, acaba ainda mais vulnerável as vontades do agressor.
Comportamento da vítima de tortura psicológica
1 – Cria justificativas para o comportamento do agressor
Como as ações do agressor tendem ser contraditória com suas palavras, a vítima confusa começa a criar explicações para as atitudes dele. Pois, isso funciona como uma espécie de mecanismo de defesa para evitar o choque da realidade da violência psicológica sofrida.
2 – Está sempre se desculpando
A vítima, por achar que é a errada na situação, pede desculpas constantemente ao agressor, mesmo quando não há motivos. Na verdade, geralmente a vítima não tem ideia do por que está fazendo aquilo, mas continua fazendo.
3 – Se sente confusa constantemente
A constante manipulação faz com que a vítima fique em um estado de confusão permanente, consequentemente, começa a pensar que está ficando maluca ou que não é uma pessoa boa. Por isso, merece o que está acontecendo com ela.
4 – Sente que não é a mesma pessoa de antes
Apesar de não saber o que mudou, a vítima sente que não é a mesma pessoa de antes de sofrer a tortura psicológica. É nesses momentos que amigos e familiares costumam apontar o que mudou e tentar alertar sobre o relacionamento abusivo.
5 – Se sente infeliz, mas não sabe o por que
Ao sofrer a tortura psicológica, a vítima começa a se sentir infeliz, e mesmo com coisas boas acontecendo ao seu redor ela é incapaz de se sentir feliz. Isso acontece porque o abuso tende a reprimir os sentimentos da vítima, então, ela não consegue sentir bem consigo mesma.
Consequências da tortura psicológica para a saúde mental
Toda forma de violência, seja física ou psicológica, causa impactos negativos na saúde mental. Mas, como a tortura psicológica tem como objetivo exclusivo perturbar o estado emocional da vítima, as consequências à saúde mental são mais acentuadas. Pois, as constantes humilhações sofridas fazem com que a vítima comece a duvidar de si mesma. Inclusive sobre sua sanidade, inteligência, autoconfiança e autoestima. Então começa a questionar se o agressor realmente não tem razão, se ela é uma pessoa ruim como ele diz e que ela merece passar por tudo aquilo.
Consequentemente, esse questionamento acaba incitando pensamentos negativos e auto depreciativos que fazem com que a vítima comece a desgostar de si mesma. Que é justamente o objetivo do agressor, pois com a autoestima baixa, a vítima cai mais facilmente em suas armadilhas e manipulações sem reagir. Ademais, a tortura psicológica pode ajudar no desenvolvimento de uma série de transtornos mentais, por exemplo, depressão, ansiedade, síndrome do pânico, estresse pós-traumático, etc.
Em estágio mais avançado da tortura psicológica, qualquer tipo de interação da vítima com o agressor requer muito esforço para ela. Pois ela teme ser confrontada por ele, preferindo ficar e silêncio para se preservar. Em suma, vítimas de tortura psicológica podem apresentar:
- Sentimento constante de infelicidade
- Paranoia
- Medo excessivo
- Esgotamento psicológico e emocional
- Comportamento defensivo
- Falta de confiança
- Dificuldade para se expressar
- Isolamento social
- Crise de choro
- Conduta retraída
- Irritabilidade
- Insônia
Além dos sintomas psicológicos, também pode apresentar sintomas psicossomáticos, como alergias de pele, gastrite e enxaqueca, por exemplo.
Tipos de tortura psicológica
1 – Constantes humilhações
A vítima de tortura psicológica sofre humilhações constantes do agressor, a princípio parece pouco ofensivo, como “Você não é muito bom nisso”. E aos poucos vai se transformando em ofensas, como “Você não é muito inteligente”. E por fim, “Você é muito burro”. Consequentemente, a saúde mental é minada diariamente, onde o agressor ataca os pontos fragilizados da vítima, ferindo onde lhe dói mais. Ademais, os abusos podem acontecer tanto em público quanto no privado.
2 – Chantagem emocional
O agressor usa de manipulação para chantagear emocionalmente a vítima, para inverter a culpa de certas situações ou até mesmo para conseguir o que quer. Geralmente, é um método de manipulação ignorado por não parecer tão relevante. Porém, é tão prejudicial à saúde mental quanto às outras formas de abuso.
3 – Tortura Psicológica:’Perseguição
O agressor psicológico não costuma desistir até que consiga o que quer, por isso, humilha, usa xingamentos e constrange a vítima, simplesmente para alimentar seu ego. Portanto, pode perseguir a vítima, simplesmente para obter a sensação de superioridade, além de fazer comentários hostis e a ridicularizar na frente de amigos e familiares para manchar sua imagem.
4 – Distorção da realidade
Um dos abusos mais comuns da tortura psicológica é a distorção da realidade, onde o agressor distorce a palavra da vítima para que ela fique confusa. Dessa forma, ela não consegue discernir o que é real ou não. Essa técnica é conhecida como gaslighting, que consiste em estimular a vítima em duvidar de sua capacidade de interpretação e assim, acreditar apenas nas palavras do agressor. Da mesma forma, o agressor pode distorcer as palavras da vítima para as pessoas ao seu redor, consolidando sua posição de detentor da verdade.
5 – Ridicularização
Ridicularizar a vítima faz parte dos abusos da tortura psicológica. Com isso, o agressor não deixa passar nada e critica constantemente. Por exemplo, sua personalidade, o modo de falar, o modo de vestir, suas escolhas, opiniões, crenças e até a família da vítima.
6 – Restrição da liberdade de expressão
A vítima de tortura psicológica é privada de se expressar abertamente, pois suas opiniões são consideradas pelo agressor como impróprias ou infames. Assim, com o passar do tempo, ela se sente como se não tivesse permissão para ser quem ela é e passa a seguir as convenções impostas pelo seu agressor.
7 – Isolamento
Para que sua tortura psicológica alcance seu objetivo, o agressor procura isolar a vítima dos amigos e familiares, para que suas manipulações sejam mais eficazes.
Como lidar com a tortura psicológica?
O primeiro passo ao identificar uma tortura psicológica é afastar a vítima do agressor. Em casos onde o agressor for um cônjuge ou um familiar que reside na mesma residência, pode ser difícil o distanciamento. Portanto, é essencial que a vítima seja levada para a casa de alguém de confiança. Pois, o distanciamento pode ajuda-la a pensar com mais clareza, sem a influência negativa do agressor.
O segundo passo é buscar por ajuda para curar as feridas emocionais causadas pelos abusos constantes e recuperar sua autoestima. Ademais, a ajuda pode vir de amigos ou familiares que tenham conhecimento da situação. Mas, é necessário que procure a ajuda de um psicólogo para auxiliar no processo de recuperação.
Por exemplo, a psicoterapia é bastante indicada para pessoas vítimas de relacionamentos abusivos ou que não conseguem cortar o vínculo com o agressor.
Portanto, com a ajuda do psicólogo, as vítimas conseguem a força necessária para reavaliar suas vidas e tomarem decisões que garantam seu bem estar e sua saúde mental. Além de auxiliar a vítima a combater as humilhações sofridas pelo agressor, que podem permanecer no seu inconsciente por muito tempo.
Em suma, um tratamento psicológico é essencial para curar os danos causados a saúde mental e ao emocional da vítima de tortura psicológica. E com o tempo, a terapia pode ajudar com que ela volte a ser a pessoa que era antes de ser uma vítima de violência psicológica.
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Fontes: Vittude, Diário do Sudoeste, Tela Vita
Imagens: Jornal DCI, Blog Jefferson de Almeida, JusBrasil, Exame, Vírgula, Psicologia Online, Cidade Verde, A Mente é Maravilhosa, HypesCience, Gazeta do Cerrado