História da Medusa: origem da maldição e diferentes versões do mito

De acordo com a mitologia grega, existem diferentes versões do mito de Medusa, especialmente com relação a sua origem monstruosa.

De acordo com a mitologia grega, a história de Medusa passa pela relação da criatura com suas irmãs, as Górgonas, e termina com a morte nas mãos de Perseu, o filho de Zeus.

O primeiro registro da personagem está na Teogonia de Hesíodo. O autor apresenta Medusa ao lado de suas duas irmãs – Esteno e Euríale –, que eram imortais, ao contrário de Medusa. Originalmente, as três irmãs monstruosas eram filhas de Fórcis e Ceto e viviam “para além do famoso Oceano, à beira do mundo, duramente à noite”.

Ainda que normalmente esteja na forma monstruosa em suas principais retratações, a mulher era muito bela, de acordo com as poesias do romano Ovídio. Mas essa é apenas uma versão da história, em meio a várias outras, como veremos a seguir:

Um monstro numa família de monstros

Árvore genealógica da mitologia grega: deuses e titãs
Árvore Genealógica de Medusa a partir de Gaia e Pontos

Vamos por partes. Começando pela família. Gaia, a Mãe-Terra, deitou-se com Pontos, o Mar. Dessa união nasceram as entidades marinhas Fórcis e Ceto. Eram divindades muito antigas, mas ameaçadoras.

Fórcis era o deus-marinho das profundezas e do perigo oculto. Já Ceto era a deusa dos monstros marinhos, baleias e grandes tubarões. Eram seres poderosos, meio-irmãos dos Titãs e do próprio Tifão.

Fórcis e Ceto se casaram entre si. Eles tiveram os próprios filhos, mais uma penca de entidades marinhas. Mas olha, “entidade marinha”, aqui, é só uma forma bonita de dizer. Na real mesmo, eram verdadeiros monstros do mar.

Primeiro nasceram as Greias. Eram três bruxas cinzentas. Simbolizavam a espuma branca do mar, e exatamente por isso eram retratadas como três velhas caquéticas. E isso desde o nascimento. Só para piorar, elas não tinham olhos. Nenhuma delas.

Ou melhor, elas tinham sim. Mas era só um, no singular, que elas tinham que compartilhar entre si. Foi daqui que a Disney pegou essa ideia. Só que no filme do Hércules quem compartilha o olho são as Moiras.

Fórcis e Ceto tiveram mais filhos-monstros. Um caranguejo gigante, um dragão de cem cabeças, uma víbora… Até que a gente chega nas Três Górgonas. E aqui entra a Medusa. Um monstro vindo de uma família de monstros.

Ou seja, ela já nasceu daquele jeito. Isso é o que dizem os poetas gregos mais antigos. A história que você acabou de ouvir veio lá da Teogonia de Hesíodo. Ele até dá um nome para as outras duas górgonas: Esteno e Euríale. Elas não são descritas fisicamente, mas né… filho de peixe, peixinho é.

Rápida citação de Homero

Antes do Hesíodo, a Medusa já tinha sido citada pelo Homero. Ou quase isso. Nas obras dele, a Medusa não tem nome, e é simplesmente chamada de Górgona. São duas citações: uma na Odisseia e outra na Ilíada.

As passagens são bem rápidas e podem até passar despercebidas. Na Ilíada ela aparece como parte da descrição do escudo de Atena, a Égide, “onde estava fixada a cabeça sombria e gigantesca da Górgona”. Já na Odisseia é dito que ela era uma das criaturas de Hades. Uma residente do Submundo.

Píndaro e Higino

Os anos se passaram, e as histórias floresceram. Por volta do século quinto antes de Cristo, a Medusa até ganhou uma descrição mais gentil. Foi feita pelo Píndaro, que imaginou a Górgona, talvez pela primeira vez, como uma mulher linda, mas aterrorizante.

Parecia que as coisas finalmente começariam a dar certo para ela. Só que não. Mais tarde, ali por volta do ano 60 antes de Cristo, o escritor romano Higino foi ainda mais cruel. Para ele, a Medusa era tão feia que transformava qualquer um que olhasse para ela em pedra. E essa versão horrenda também foi descrita pelo viajante grego Pausânias.

Acabou que a Medusa entrou para a história com aquela descrição que a gente tá cansado de ver em filmes, séries e jogos. Cabelos de serpentes, presas pontiagudas, mãos de bronze e até asas de ouro, em algumas descrições isoladas. Essa era a Medusa. Um monstro. 

Envolvimento com Poseidon

Medusa

Até agora, nem o Poseidon e nem a Atena entraram nessa história. Então vamos voltar lá para o começo. Para Hesíodo, mais de seiscentos anos antes de Cristo.

Porque sim, Medusa e Poseidon tiveram um caso. Mas aí fica o questionamento: ela foi forçada a se deitar com ele, ou consentiu com o ato? E é justamente aqui que a história começa a se complicar um bocado.

O Hesíodo apenas diz que ela, a Medusa, se deitou em um campo macio, dentre as flores da primavera, com aquele de cabeleira azul. “Aquele de cabeleira azul”, é claro, era o próprio Poseidon. E isso é tudo o que a gente sabe desse relacionamento. Se foi forçado ou não, nesse caso, vai ficar da interpretação de cada um.

O que aconteceu depois você já sabe. A Medusa foi decapitada por Perseu, e do pescoço dela surgiram duas criaturas: o gigante Crisaor e o cavalo alado Pégaso. Isso aconteceu porque ela já estava grávida, e os filhos dela tinham que nascer de um jeito ou de outro.

O Crisaor continuaria a tradição da família e teria mais um filho monstro, o Gerião, aquele cara de três cabeças. Já o Pégaso ainda seria o companheiro de muitos heróis.

Ajax e Cassandra

Antes de continuar a história da Medusa, precisamos falar um pouco sobre o Ajax. E não, ele não tem absolutamente nada a ver com ela. Não diretamente. Na verdade, em tese, é uma figura mais tardia: foi um dos comandantes gregos da Guerra de Tróia. Inclusive estava lá, dentro do Cavalo de Tróia, e foi um dos invasores da cidade quando o cerco finalmente terminou.

Dentro dos portões de Tróia vivia a sacerdotisa Cassandra, que sofria de uma maldição. Embora pudesse prever o futuro, ninguém acreditava nas suas palavras. Ela previu que Helena seria sequestrada, previu a Guerra de Tróia e o que aconteceria com a cidade. Até desconfiou do cavalo de madeira e alertou os troianos de que havia gregos escondidos lá dentro. Mas ninguém ouviu uma palavra sequer dos seus avisos.

Mas ela estava certa. Na hora da invasão, Cassandra se refugiou no templo de Atena. E ali, agarrada numa estátua da deusa, foi brutalmente violada pelo Ajax. Atena ficou horrorizada. Aliás, muito mais do que isso, ficou enfurecida com o sacrilégio. Ela amaldiçoou o comandante grego a nunca mais voltar para casa. Era o fim do Ajax.

Se você conhece a história da Medusa, já sabe onde eu quero chegar: Ovídio, um dos mais importantes poetas romanos. Nasceu no ano 43 antes de Cristo e viveu até o ano 17. Escrevendo muito até o dia da sua morte. E foi ele que contou uma história diferente sobre a Medusa; uma história estranhamente parecida com o conto de Cassandra e Ajax.

A história de Ovídio

Netuno
Netuno, o Deus dos Mares

Para começo de conversa, a Medusa não era feia. Muito pelo contrário. Era uma linda sacerdotisa da Deusa Atena. Ou Minerva, já que essa é uma história romana.

Medusa inclusive tinha feito um voto de castidade. Mas um dia, foi seduzida pelo Senhor dos Mares, o Deus Netuno; que era o Poseidon dos romanos. Ela recusou todas as suas investidas, mas foi violada por ele. E pior: o ato aconteceu dentro do santuário. Minerva ficou enfurecida. Não quis nem ouvir o que a Medusa tinha a dizer.

Nas palavras de Ovídio: “E Medusa, como punição, teve seus adoráveis cabelos transformados em cobras repugnantes”.

Esta é a história. Mas claro que existem diferentes interpretações. Tem até quem diga que a Deusa Minerva, ao invés de punir, na real estaria protegendo a Medusa contra novas investidas, já que ela agora podia transformar os homens em pedra.

Seja como for, o Ovídio usou a palavra punição mesmo. É praticamente a história de Cassandra e Ajax, só que com os valores invertidos, já que aqui quem foi punido pela deusa foi a vítima, e não o agressor, como no caso do Ajax.

Outras versões

Mas olha, esta não foi a primeira vez que Atena e a Medusa tretaram. Ali por volta do século II antes de Cristo, alguém já tinha contado uma história parecida. Faz parte da Biblioteca do Pseudo-Apolodoro, e ela diz o seguinte: que a Medusa era sim uma mulher muito bonita. Tão bonita que teve a audácia de se comparar com a própria Atena. Por isso foi decapitada a mando da deusa, que não gostou nenhum pouco dessa ousadia. 

Percebeu como as versões do mito podem variar de um autor para o outro? Lembrando que estas histórias vão se construindo com o passar dos anos. E outra, só uma parte delas chegou até nós. Uma grande parte, porque os gregos e os romanos deixaram muita coisa escrita.

Ainda assim, não sabemos como foi feita essa evolução. Como a Górgona terrível do Homero, de alguma forma se tornou uma linda donzela injustiçada para o Ovídio.

Lembre-se: quase mil anos separam um do outro.

Poderes da Medusa

História de Medusa: mito de Perseu e origem da maldição
Britannica

De acordo com as lendas da mitologia, quando o sangue escorreu da cabeça da Medusa, as gotas de sangue assumiram formas de serpentes venenosas. Além disso, mesmo derrotada ela continuou a apresentar a habilidade de transformar seres em pedra.

Muito mais tarde, quando Perseu pediu um lugar para descansar para Atlas, mas não foi ouvido, foi o poder da górgona que ajudou o herói a derrotar o titã. Perseu utilizou a cabeça da Medusa para parar Atlas, que foi transformado em uma montanha; as cordilheiras do Atlas.

O herói também usou a cabeça de Medusa para resgatar a princesa Andrômeda, que seria sacrificada a um monstro marinho para punir sua mãe Cassiopeia. O poder também aparece nos combates contra Phineus, tio de Andrômeda, Proetus, usurpador do trono de Argos, e Polidectes.

Após usar os poderes da Medusa ao longo de sua jornada, Perseu entregou a cabeça à deusa Atena.

Simbologia da história de Medusa

História de Medusa: mito de Perseu e origem da maldição
History

Embora a criatura seja apresentada normalmente como um monstro, a cabeça poderosa também pode servir como símbolo de amuleto. O próprio nome Medusa, por exemplo, tem origem num verbo grego antigo que significa guardar ou proteger. Se considerarmos o culto das amazonas à deusa serpente como variante da criatura, também pode-se atribuir o sentido de sabedoria feminina.

Por causa disso, a imagem da Medusa aparece em vários artefatos comuns para gregos e romanos. O símbolo pode ser visto, por exemplo, em escudos, couraças e mosaicos encontrados ao longo da história.

Além disso, existem uma série de estátuas, pingentes e moedas que trazem a imagem da cabeça da Medusa. Muitas vezes, o símbolo aparece ao lado de Perseu, segurando a cabeça nas mãos.

Ao longo da história, o rosto da Medusa também apareceu como símbolo de lutas importantes, como dentro de grupos feministas, por exemplo.

Fontes: Toda Matéria, Aventuras na História, Só Científica, Newronio, Theoi.com

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