Não importa onde, o verão sempre costuma ser uma das épocas mais aguardadas do ano. Ele é sinônimo de férias, passeios e praias. Contudo, o verão até então, que começou no dia 21 de dezembro, tem deixado marcas pesadas demais em várias partes do país. Nesse sentido, o problema corre de Norte a Sul. Só na última semana, 34 pessoas morreram em decorrência de chuvas fortes em São Paulo, sendo 18 delas do município de Franco da Rocha. Assim, vale se questionar: por que Brasil vive picos de chuvas e calor em 2022?
Da mesma forma, no começo do verão, mais de 20 pessoas morreram e quase 1 milhão ficaram desabrigadas após chuvas fortes atingirem o sul da Bahia. Dias depois, algo semelhante se repetiu em Minas Gerais, com mais de 20 mortes e 340 municípios em estado de emergência. Só a Bahia e Minas Gerais chegaram a registrar de 500 a 700 milímetros de chuva em poucos dias, um volume que ocorreria em uma estação inteira.
Por outro lado, em outros estados, o problema já era o calor intenso. No Rio Grande do Sul, municípios no Oeste registraram temperaturas de até 41,7 graus em janeiro. Esse é o maior calor medido na história da região. Em São Luiz Gonzaga, a temperatura ultrapassou 42 graus, sendo a média de verão dos municípios da região de 27 graus. Várias ondas de calor e chuvas extremas foram registradas em diferentes estados do Brasil. Países vizinhos também sofreram o mesmo destino.
Por que Brasil vive pico de chuvas e calor em 2022?
Mas afinal, seria isso normal? Os extremos do verão de 2022 vem chamando a atenção de muitos meteorologistas, que acompanham de perto a situação. “Os verões estão ficando mais irregulares e extremos”, comentou José Marengo, diretor do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden). Seja como for, picos de calor, chuvas fortes e estiagens já foram comuns em diversos verões brasileiros, como em 2005 e 2015.
Tanto naquela época quanto agora, os extremos possuem a mesma causa: o complexo fenômeno atmosférico do La Niña. Nele, temperaturas das águas da superfície do Oceano Pacífico sofrem um resfriamento. Isso implica no clima do planeta inteiro, em um efeito cascata. Já na América do Sul, o La Niña afeta os “rios voadores”, corredores de umidade da Amazônia. Assim, ela é responsável por chuvas em boa parte do continente. O fenômeno ainda antecipa a chegada de chuvas em regiões como Norte, Nordeste e Sudeste.
Dessa forma, o corredor de umidade acaba não chegando ao Sul. Ou seja: há chuvas demais no Sudeste, fazendo com que falte chuva no Sul, onde o clima fica muito seco. Além disso, uma consequência é a formação de uma “bolha seca” na região Sul, e corredores de umidade não conseguem penetrá-la. Dentro da bolha, o solo vai ficando mais quente, e isso aumenta ainda mais a temperatura.
O segundo ano do La Niña
Algo que dificulta ainda mais a situação de por que Brasil vive pico de chuvas e calor em 2022 é o fato de que o La Niña está acontecendo pela segunda vez consecutiva. Entre setembro de 2020 e maio 2021, o fenômeno provocou chuvas fortes no Brasil, combinado com calor recorde e estiagem. Em outubro de 2021, ele voltou a acontecer.
“É o segundo ano consecutivo do La Niña e isso tem efeitos sobre o clima no país”, comenta Estael Sias, meteorologista da Metsul. “Na estiagem anterior, o nível dos rios havia caído muito e já estávamos enfrentando uma crise hídrica e energética. A chegada de um novo La Niña não deu tempo para os rios se recuperarem. A chuva de inverno não foi suficiente. O solo também não se recuperou da seca e estamos enfrentando um segundo ano consecutivo de estiagem severa.”
Seja como for, no final de janeiro, pela primeira vez uma frente fria conseguiu “furar” a bolha seca do Sul. Isso explica as fortes chuvas que caíram em poucos dias e alagaram as cidades. Mesmo assim, o volume não foi o suficiente para acabar com a estiagem na região.
Aquecimento global
Um terceiro La Niña já foi descartado pelos meteorologistas para este ano. Dessa forma, a partir de abril e maio, é possível que a temperatura volte para um patamar normal, ou seja, com médias históricas de chuvas e temperaturas. Contudo, algo que chama a atenção é o fato dos fenômenos climáticos ficarem cada vez mais extremos. Para José Marengo, a explicação é o aquecimento global.
“É o aquecimento global que torna o clima muito mais variável. As projeções mostram grandes áreas do mundo com aumento na frequência do calor. Existe um aumento de eventos de chuvas extremas, em que o volume de um mês inteiro cai em apenas um ou dois dias”. De acordo com ele, extremos observados no Brasil se repetem em outras áreas do planeta, como América do Norte, Europa e Austrália. Lá, ondas de calor provocaram incêndios florestais de proporções gigantescas.
Dessa forma, além da ação global pelo clima, com redução de emissões e desmatamento para controlar o aquecimento global, os governos precisam investir em medidas de adaptação. Assim, precisam proibir construções em áreas de risco e investir em infraestrutura para lidar com fenômenos extremos. “Esse tipo de planejamento precisava já ter sido feito”, completa Marengo.